Uma empresa de transporte de valores e segurança pediu a rescisão do contrato por justa causa dos dois empregados ao juízo da 12ª Vara do Trabalho de Vitória (ES). Segundo a contratante, os ambos os funcionários acumularam uma série de más conduta que justificava o desligamento. Alguns exemplos:
- Fraudes nos controles de ponto, utilização indevida do celular da empresa para assuntos particulares
- Condução temerária do veículo da empresa
- Desmonte parcial do veículo para localizar equipamento de filmagem e gravação instalado
- Permitir que terceiros acessem o interior do veículo
Entretanto, ambos os empregados possuíam estabilidade provisória por serem dirigentes sindicais.
Dano moral
Os empregados, por sua vez, apresentaram reconvenção (inversão das partes do processo). Eles fizeram um pedido de indenização por dano moral. Ele afirmaram que a empresa praticava diversas atitudes como rebaixamento de função, corte de horas extras e aplicação de advertências, que prejudicava o desenvolvimento do trabalho e os funcionários. O juízo de primeiro grau julgou que:
- Nenhum dos fatos narrados pela empresa era suficiente para configurar falta grave justificável a aplicação de justa causa aos dois dirigentes sindicais;
- As atitudes apontadas pelos empregados também não caracterizam dano moral indenizável.
Por conta disso, ambos os pedidos foram considerados improcedentes. Porém, no julgamento do recurso ordinário, o Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (TRT17) declarou a extinção dos contratos de trabalho por justa causa. O TR entende que há perda de confiança “quando o empregado faz devassa no veículo da empresa, a fim de localizar câmeras de segurança, considerando-se tratar de empresa de transporte de valores”.
A vigência do contrato de trabalho foi mantida até o encerramento do caso. Entretanto, houve suspensão da prestação de serviço, sem prejuízo dos salários dos empregados.
E-mails “secretamente” enviados
Após a mediação do recurso de revista, os empregados pediram a juntada de e-mails internos da empresa. Ele afirmaram ter conseguido as provas por um pen drive e de forma anônima. O conteúdo presente nesses e-mails, segundo eles, seriam suficientes para contestar a decisão do TRT. A empresa de transporte, por sua vez, afirmou que as provas teriam sido obtidas de forma ilegal, pois os empregados não eram interlocutores das correspondências eletrônicas.
Seguindo o fundamento no sigilo profissional previsto no Estatuto da OAB (Lei 8.906/1994), foi requisitado que o material fosse desconsiderado e retirado imediatamente do processo.
Para a relatora do recurso, ministra Delaíde Miranda Arantes, “resta claramente evidenciado que houve acesso aos e-mails mesmo sem prévia autorização judicial, em violação ao sigilo de correspondência”. A ministra apontou que a Constituição da República assegura o sigilo de correspondência, de dados e das comunicações telefônicas (artigo 5º, inciso XII), salvo se houver autorização judicial prévia. Delaíde também mencionou a Lei das Telecomunicações (Lei 9.472/1997, artigo 3º, inciso V), que garante ao usuário “o direito à inviolabilidade e ao segredo de sua comunicação, salvo nas hipóteses e condições constitucional e legalmente previstas”.
Além disso, há o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014, artigo 7º), que trata dos princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil e assegura a inviolabilidade dos dados armazenados em dispositivo privado ou transmitidos pela rede mundial de computadores. “Os próprios empregados admitem que os e-mails são de propriedade da empresa e que foram obtidos de forma anônima. Trata-se, a toda evidência, de prova contaminada, ilegítima e ilegal, impossível de ser usada para a formação do convencimento do julgador”, afirmou a relatora.
Por unanimidade, a Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) considerou inválido como meio de prova o conteúdo de e-mails.
Processo: RR-44900-19.2012.5.17.0012